No último sábado eu estava podre, mas muito podre. Não consegui sair de casa, não tinha concentração para nada (vim a saber depois que estava com COVID já), então resolvi pegar algum livro-conforto. Geralmente acabo optando por Anne Rice ou Stephen King, mas dessa vez eu queria uma das minhas latino-americanas esquisitas. Escolhi Saboroso cadáver, da Augustina Bazterrica, que foi publicado aqui pela Darkside, com tradução de Ayelén Medail.

Comentei com a Jéssica que estava lendo esse livro para me distrair da peste e ela: “Você escolheu se distrair com um tiro no cu”. Acho que esse é um bom resumo do que é essa obra. Peguei sem ler sinopse, adoro as surpresas das latinas, mas pelo nome eu sabia que vinha no mínimo canibalismo. Mas eu não sabia que viria dessa forma…
(Se ao contrário de mim, você gosta de saber do que se trata o livro, continue esse texto. Caso contrário, leia lá e depois venha me contar o que achou).
Sempre falo das latinas como um conjunto, o que não deixa de ser verdade. O terror da América Latina é diferente, nem sempre tem castelos, portas rangendo e vento uivando. O nosso terror é aquele do dia a dia, das mulheres, dos oprimidos. Saboroso cadáver mostra uma sociedade em que os animais foram todos exterminados por uma determinada doença. Os humanos viraram vegetarianos? Claro que não, foram lá praticar o canibalismo, ótima ideia.
Os açougues e frigoríficos agora possuem corpos humanos, vivos, em pedaços, congelados. Claro que para as mulheres a situação é pior em todos os cenários, pensando na questão da reprodução, de corpos vulneráveis e etc. Nessa sociedade há algumas regrinhas de “isso pode, isso não pode”, do que seria ético no consumo da carne humana. Um monte de desculpinha para aliviar a consciência das pessoas.
O protagonista é um cara que não come carne desde que seu filho faleceu. A esposa está longe, cuidando de seu luto e ele se vê sozinho numa vida chata, num emprego que não gosta (no frigorífico) e levando tudo adiante para poder pagar o asilo de seu pai. Tudo corre na mesma monotonia, até que ele recebe uma “fêmea” de presente e não sabe muito bem o que fazer com ela. Claro que as coisas desandam e ele tem a brilhante ideia de estuprá-la e depois mantê-la em cárcere até que o bebê nasça.
Ainda não sei muito bem o que achei do final. Fico dividida entre achar que foi um pouco corrido e preguiçoso por parte da autora; mas também poderia ser algo como “a humanidade é esse lixão mesmo e não tem como esperar outra coisa”. De qualquer forma, eu gostei muito da narrativa, de como ela usou algo “fantasioso” para mostrar uma realidade não tão distante da gente. É triste ver que ser mulher é uma merda em qualquer situação.