Esse segundo domingo de 2023 foi bem estranho. Semana passada eu estava me acabando de chorar de felicidade junto das minhas amigas. Hoje está um tempo frio e cinzento em São Paulo. Tivemos nosso primeiro encontro do Leia Mulheres, um especial com a escritora portuguesa Rute Simões Ribeiro, enquanto um bando de terroristas invadia Brasília. Ser brasileiro é viver um monte de emoções contraditórias.

Ano passado trabalhei algum tempo na Editora Nós e tive o prazer de acompanhar de perto o nascimento da edição brasileira de A breve história da menina eterna. A autora já possui diversos títulos publicados de forma independente em Portugal, e espero que esse seja o primeiro de muitos a serem lançados aqui.
Bom, eu não consigo escrever resenhas sérias, acadêmicas ou o diabo que for, sempre falo dos livros relacionando-os com o que senti durante a leitura. Aqui ainda tem o acréscimo de eu ter conhecido a Rute e passado dias muito agradáveis ao lado dela. Também tive o prazer de mediar a conversa no lançamento que ocorreu aqui em São Paulo em novembro.
Quando você é leitor e está ao lado de alguém que escreve, você quer saber detalhes, influências, todos os porquês que envolvem aquele texto. Neste livro Rute nos traz a história da menina M, apenas M, que vive uma vida simples, mas com uma diferença: ela não sabe da existência da Morte. A Mãe a criou numa fantasia em que as pessoas são eternas, elas apenas “vão embora”. Até um dia que a Mãe vai embora e M decide ir morar numa nova cidade. Claro que ali ela tem contato com o mundo, passa a enxergar mais do que via naquela pequena cidade, e a Morte logo se torna uma conhecida.
A primeira vez que li esse livro foi através de trechos, em páginas brancas de sulfite. Com o exemplar em mãos, o li para me preparar para o lançamento. Nessa primeira semana de 2023 eu o reli para o encontro, e me vi diante de um novo livro. Uma história contada por uma pessoa tem um peso, quando você a lê tem outro, e depois de abraçar quem o escreveu, há uma nuance totalmente diferente.
A Morte se tornou presente na minha vida quando eu já era adolescente. Demorei para vê-la de perto, mas ela se tornou uma constante. Morte pela idade, por suicídio, nos diversos livros que leio. Caitlin Doughty foi a responsável por me fazer perceber a Morte como algo do dia a dia, uma certeza a ser encarada de forma prática. O podcast Finitude só reforçou essa nova visão. Aí chegou a Rute com uma escrita poética nos propondo uma discussão sobre fins.
Rute faz aniversário um dia depois de Saramago. Em As Intermitências da Morte, a Morte se aposenta. Li esse livro na faculdade e gostei bastante, mas eu tinha outra cabeça. Li mais alguns do autor no início da vida adulta, mas logo o deixei de lado. Além de compartilhar ideias imensas comigo, Rute me levou de voltar ao Saramago.