Febre Tropical, de Juliana Delgado Lopera

A primeira vez que li a respeito de Febre Tropical foi no Literary Hub, site que acompanho diariamente. O nome ficou na minha cabeça e foi com muita alegria que eu descobri que ele seria lançado no Brasil pela Editora Instante, traduzido pela Natalia Borges Polesso.

Antes de qualquer coisa, vamos falar dessa capa. A história do livro se passa em Miami no começo dos anos 2000, logo, a capa é mais do que perfeita. Fiquei pensando muito no filme Projeto Flórida quando a vi pela primeira vez, e durante a leitura a impressão de mostrou acertada. O enredo também acontece num conjunto de apartamentos, com uma piscina suja e algumas espreguiçadeiras. Com o detalhe de alguns patos e guaxinins.

Juliana Delgado Lopera nos conta a história da família Juan, que saiu da Colômbia para Miami quando a narradora, Francisca, tinha 15 anos. Ela, sua irmã Lucía, a mãe Myriam e a avó, Alba, que é chamada de La Tata formam uma família excêntrica, porém não tão diferente das famílias que conhecemos. Myriam se agarra à nova oportunidade de vida nos Estados Unidos, se une ao grupo religioso e espera que as outras mulheres sigam o mesmo caminho. Lucía parece ser a única realmente engajada na religiosidade. La Tata está sempre com uma latinha de Sprite, que ela preenche com rum. Todas parecem ignorar o problema da matriarca com o álcool, mas Francisca cuida dela, dá água e comprimidos para cortar a ressaca.

Francisca é a típica adolescente que fuma, usa delineador preto nos olhos e camisetas de bandas como The Cure. Mas chegando a Miami ela se vê sem amigos, sem conhecer nada e acaba aceitando entrar para o grupo de jovens religiosos. Porém, ela não é motivada por Jesus Cristo, mas sim por Carmen, a filha dos pastores. As duas vivem grudadas realizando tarefas da igreja, mas Francisca se apaixona cada vez mais por ela. Há uma reciprocidade de sentimentos, e Carmen parece não saber lidar com isso e parte para a Colômbia por um tempo.

A protagonista se vê perdida, acaba nos braços de Wilson, filho de uma das mulheres da igreja, e ele se torna um namorado aprovado pela mãe. Está sempre na casa delas, mesmo que Francisca duvide de seus próprios sentimentos pelo jovem.

Um ponto muito interessante do livro é que ele é narrado em inglês e espanhol. Natalia Borges Polesso deve ter tido um trabalhão para traduzir isso, mas felizmente há um glossário no final e a narradora mesma diz para o leitor fazer buscas no Google. A escrita é muito ágil, impossível não ler rápido, pensando em uma voz alta te contando uma história numa mesa de bar.

Logo no começo do livro tem uma passagem que eu gostei muito: “As mulheres da minha família possuíam um sexto sentido, não necessariamente por serem mães, mas pelo acirrado policiamento da nossa tristeza: sua tristeza não era sua, era parte de um pote coletivo maior da Tristeza de Mulher com o qual todas nós contribuímos.” E o livro trata claramente disso. Claro que o foco fica em Francisca, na adolescência e descoberta da sua sexualidade, mas cada mulher ali carrega sua tristeza.

Há capítulos dedicados às histórias de Myriam e de Alba. A matriarca era famosa em seu tempo por dispensar pretendentes. Ela queria estar sempre junto a seu rádio e também escrever novelas. Mas por pressão do pai, se casou cedo. Ele não queria sustentar uma filha solteirona. Myriam, por sua vez, queria ter um escritório, ser importante. Teve uma fase difícil na adolescência, saiu de casa revoltada pela pobreza que enfrentavam. Também se casou por imposição e não realizou sonhos.

Todas ali estão sofrendo de alguma forma. A avó se afoga no rum, a mãe nos remédios, Lucía se apegou à religião. Francisca tem seus cigarros, o livro Ariel da Sylvia Plath e Andrea, uma vizinha com quem ela passa bastante tempo. O livro termina com ela ainda jovem. Espero que Francisca tenha conseguido sair desse ciclo de mulheres tristes.

Febre Tropical é finalista do Lambda Literary, e espero que seja premiado, pois foi uma surpresa maravilhosa.

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