Texto publicado originalmente na Alpaca Press (2015)
Segundo os autores Bueno e Góes, no livro O que é Geração Beat (Brasiliense) o termo “beat” pode ser definido como “textos em ação, prosa espontânea, frases do corpo em movimento, poesia brotando como visões do céu e do inferno, ligação direta da arte e da vida, da palavra e do corpo”.
Quando falamos em Geração Beat, os primeiros nomes que saltam à lembrança são Jack Kerouac, William S. Burroughs e Allen Ginsberg. Mas e as mulheres? Elas estavam ali, não apenas como as namoradas e coadjuvantes dos principais representantes: elas escreviam, criavam arte e compartilhavam do estilo de vida que eles levavam.
Entra elas, temos Diane di Prima, poeta e autora do livro Memórias de uma Beatnik. Antes de falar deste livro, é necessário ter em mente que o mesmo foi escrito sob encomenda, cujo editor pedia incessantemente que ela acrescentasse mais cenas de sexo. Isso não tira o mérito da obra, mas é importante saber disso para que o foco não fique apenas nas tais cenas.

Como diz o título, é um relato das memórias de Di Prima, vivendo nos Estados Unidos, no início dos anos 50. Conhecemos a vida da autora quando a mesma abandona a faculdade para viver com uma amiga. A partir daí, são inúmeros apartamentos, parceiros e trabalhos não tão usuais, mas apenas necessários para que ela pudesse comprar aquilo que precisasse.
Diane di Prima chegou a morar na rua e até posou como modelo para algumas fotos, para poder garantir sua sobrevivência. Ao longo do livro, observamos que ela não precisava de grandes luxos, apenas de algo para comer, um lugar para dormir, um cartão de biblioteca e a convivência com diversas pessoas com as quais ela costumava dividir os apartamentos.
Algumas cenas de sexo são bem escritas e realmente fazem parte de um contexto, mas em sua maioria são apenas encaixes que destoam da narrativa. Só que esse não é um ponto que particularmente me incomodou. A vida de Diane di Prima por si pode ser considerada controversa nos dias de hoje, justamente pelo fato de ser a vida de uma mulher. Lemos diversos livros escritos por homens em que o sexo é descrito da mesma forma e não há tanto estranhamento. Agora imagine esse estilo de vida nos anos 50, bem antes da revolução cultural e da segunda onda feminista.
Memórias de uma Beatnik, livro sobre liberdade, sobre não seguir regras da sociedade, sobre criar e sobre ser uma beat, antes mesmo do termo ter sido criado, bem antes de ela conhecer Jack Kerouac e Allen Ginsberg no loft de um amigo em comum. Foram mulheres como Diane di Prima que abriram espaço para uma revolução que é feita até hoje pelas mulheres: liberdade e direito sobre o próprio corpo e próprias ações.
Tradução de Ludimila Hashimoto.