Eu sempre digo que uma das melhores coisas do Leia Mulheres é que passei a ter contato com as mais diversas culturas. Graças ao nosso projeto eu estou sempre atrás de escritoras de países distantes. No começo desse ano a Editora Moinhos anunciou que iria publicar Damas da Lua, da Jokha Alharthi, que foi o ganhador do prêmio literário Man Booker International em maio do ano passado.
O que esse livro tem de tão diferente? Ele se passa no Omã, país do qual eu conhecia muito pouco. Essa foi a primeira obra do país publicada em português e também em inglês. A gente fala desses prêmios, que não são interessantes e tal, mas eles abrem as portas para escritores desconhecidos por nós. A tradução foi feita diretamente do árabe, por Safa Jubran.
O enredo de Damas da Lua traz a história de uma família, focando em Mayya, que se casa após ter o coração partido. Ela dá a luz a uma menina para qual ela dá o nome de London, que causa estranheza em todos, menos no pai Abdallah. Aliás, cada capítulo leva o nome de um personagem e meus preferidos foram justamente os de Abdallah. Ele sabe que sua esposa não o ama, mas ele trata a família com muito carinho e respeito.

Acompanhamos a vida dos outros familiares, das irmãs de Mayya, uma que aceita se casar com o filho de um comerciante, enquanto a outra espera por um primo que está no Canadá. Os pais de Mayya levam um casamento por conveniência, o pai se envolve com outra mulher durante o enredo, e a mãe tenta encaminhar as filhas para seus respectivos futuros.
Ao longo do livro Jokha Akharthi traz um pouco da história de Omã. Para minha surpresa, a escravidão foi legal no país até 1970. É muito assustador pensar nisso, ainda mais que vemos uma história parecida com a do Brasil. Depois da abolição os ex-escravos continuavam nas casas, trabalhando e cuidando de todos, talvez por não conhecerem outras vidas. No momento estou lendo Menino de Engenho do José Lins do Rego e há uma passagem que ele conta mais sobre as ex-escravas idosas que continuam vivendo lá, que são tratadas como avós das crianças.
Na página 159 um trecho me despertou a atenção: “Na década de 1940, a ideia de instruir os omanenses assustava o poder. Uma grande autoridade chegou a comentar com seu colega inglês: ‘Vamos educar os omanses como vocês educaram os indianos que depois se revoltaram contra vocês e logo se livrariam totalmente de vocês?'”. Qualquer semelhança com o Brasil de 2020 é mera coincidência, não?
Como comentei acima, a narrativa de Alharthi foca na família de Mayya, intercalando as histórias dos integrantes e pessoas ao redor. Ela vai e volta no passando, criando uma teia. A história é muito bem contada, sem grandes reviravoltas, mas sua escrita é muito fluída, a tradução está ótima e você entra de cabeça nas páginas.
Leitura feita em parceria com a Juliana Brina do The [Blank] Garden que também escreveu uma resenha.
Também gostei muito da voz do Abdallah, especialmente aquele final meio fluxo de consciencia. Eu queria que a autora tivesse explorado mais outras personagens que apareceram, especialmente a Zafira e a Asma. Gostei muito da leitura conjunta, Michelle! 🙂
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