Chantal Akerman

Conheci a diretora num curso que fiz em 2015. A professora exibiu um trecho de Là-bas, que eu me deixou intrigada e ao mesmo tempo exausta. Hoje, cinco anos depois, sei que é isso que a filmografia de Akerman faz com você: ela te cansa, mas cada segundo daquilo é recompensador.

O primeiro que vi em casa foi o clássico Jeanne Dielman, 23, quai du commerce, 1080 Bruxelles, talvez seu filme mais conhecido. Acompanhamos o dia a dia de Jeanne, uma mãe solteira, dona de casa. Seus dias se dividem entre cuidar do filho, da casa e se prostituir. Dia após dia, um igual ao outro, exaustão elevada à enésima potência. E um final aterrador. Você sai desse filme sem saber direito para onde ir.

Eu gosto muito de como Chantal usa a cozinha como cenário de vários de seus filmes. Esse espaço sempre foi dedicado às mulheres, para o bem e para o mal. É um local de união, de conversas, onde o alimento é preparado, mas também é um símbolo de opressão das mulheres. A diretora mistura esses dois sentidos.

Jeanne Dielman, 23, quai du commerce, 1080 Bruxelles

O curta Saute ma ville, de 1968, seu primeiro trabalho, mostra um pouco do que a Chantal viria a fazer. Eu gosto demais da estranheza de seus filmes, das narrativas paradas, longas tomadas dos locais, expressões estranhas. Me lembra um pouco o impacto que foi ver um filme do Bergman pela primeira vez. Eu estava acostumada a um tipo de cinema, até aparecer Persona e mudar toda a minha visão.

Agora em junho estou fazendo essa maratona de ver apenas filmes dirigidos por mulheres e um dos escolhidos foi Les rendez-vous d’Anna, de 1978, que eu ouso dizer que é meu preferido dela. Anna, uma diretora de cinema, viaja para a Alemanha para a exibição de um dos seus filmes. Ela tem encontros com as pessoas da produção, com um homem, e todos falam muito enquanto ela escuta.

Antes de ir para Paris, ela para em Bruxelas para passar uma noite com sua mãe. Há uma cena das duas deitadas na cama, Anna nua, contando para a mãe sobre uma experiência lésbica que teve na Itália. É a única vez que vemos Anna falando, abrindo seus sentimentos. De resto, ela apenas escuta e não diz nada. Os enquadramentos desse filme beiram a perfeição. A cada vez que penso nele mais me apaixono.

Les rendez-vous d’Anna

Chantal Akerman tinha uma relação muito forte com sua mãe. Na década de 70 ela foi morar nos Estados Unidos, enquanto sua família permaneceu na Bélgica. Em 77 ela lançou o documentário News from Home, no qual ela filma as ruas de Nova Iorque, e a própria Chantal lê as cartas da mãe, amorosas, passivo-agressivas, saudosas.

Já em 2015 ela lançou No Home Movie, outro documentário, dessa vez com a presença de sua mãe, Natalia Akerman, uma das sobreviventes do Holocausto. No filme temos as duas conversando, se alimentando, revivendo memórias. Natalia faleceu pouco tempo depois que as filmagens terminaram. Chantal cometeu suicídio em outubro de 2015.

Em meio à sua filmografia temos uma comédia romântica, Um Divã em Nova Iorque, de 1996, com Juliette Binoche e William Hurt. É um filme completamente inusitado, leve, mas mesmo assim você enxerga o dedo da Chantal Akerman.

O último filme dela que vi La Captive, de 2000, uma adaptação de Proust. Simon e Ariane possuem um relacionamento bizarríssimo. Ele é ciumento, controlador, a segue, exige que ela conte em detalhes o seu dia a dia, faz questão que ela esteja sempre acompanhada de uma amiga, que lhe conta tudo. E Ariane parece perfeitamente OK com essa situação. Estranho, mas sempre interessante.

La Captive

Queria ter palavras melhores para falar dessa diretora, dizer que seus filmes valem a pena por isso e por aquilo, mas eu acho que eles são como a poesia, questão de gosto. Eu acho que o esforço vale a pena, te tira da zona de conforto e te abre um novo leque de cinema.

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