As leituras engrenaram, finalmente. Passei da metade de Quem teme a morte, da Nnedi Okorafor (trad. Mariana Mesquita, Geração Editorial) para o Desafio Leia Mulheres e estou adorando. Não sou lá muito fã de fantasia, mas esse livro é incrível. Em breve volto aqui para falar mais dele. Tive que dar um tempo em The Lady from the Black Lagoon da Mallory O’Meara, mas também estou gostando muito.
Eu e a Gabi vamos fazer uma live para comentar o livro O Amigo, da Sigrid Nunez (trad. Carla Fortino, Editora Instante), então essa foi a leitura que dei um gás nesse mês. O enredo é bem bacana: um professor e escritor comete suicídio e deixa um cachorro já idoso e enorme aos cuidados de uma amiga. O livro é narrado por essa amiga, ela vai conversando com o escritor.
As conversas são interessantíssimas, ela fala sobre cachorros, sobre gatos, sobre ela mesma, sobre violência contra a mulher, e acima de tudo, sobre a literatura e a escrita. A amiga é a típica solteirona que ama gatos e nunca se casou. O leitor fica com a impressão de que isso aconteceu porque ela tinha alguma ligação bizarra com o escritor, apesar dele ser mulherengo e já estar na terceira esposa.
Não quero fazer aqui uma resenha do livro, pois vou falar bastante dele na conversa com a Gabi, mas queria comentar alguns pontos que mexeram comigo. O mais óbvio é essa questão do suicídio. Perdi uma amiga em 2014 e demorei uns bons anos para entender o que estava acontecendo comigo e como eu poderia lidar com aquilo. Fiquei muito tempo afastada dessa temática, não conseguia ler, mas com O Amigo foi diferente. Me senti na pele da amiga.
Tem uma passagem muito interessante que ela cita um centro de acolhimento de mulheres que sofreram violência. Elas eram encorajadas a escrever, e isso funcionava como parte do tratamento. A escrita sempre foi uma válvula de escape para a maioria das pessoas (eu inclusa), mas a Hilda Hilst dizia que para ela era algo muito trabalhoso e difícil. Às vezes também acho complicado e exaustivo, mas me parece necessário. Colocar no papel para tirar um pouco da cabeça. Balancear.
Nunez também cita o filme Para Sempre Lilya, que vi quando era muito nova e me impactou. Nunca mais revi, mas lembro dele em detalhes, mais do que eu gostaria. Comprei o dvd, emprestei para um amigo de ex e ele nunca mais me devolveu. Talvez seja bom. Quando mais nova eu gostava de ver coisas pesadas, agora não. Gosto da bad vibe controlada.
Ela tem outra passagem muito interessante que diz: Para mim, escrever poesia é como orar, e a oração não é algo que você precisa compartilhar com as pessoas. Realmente, eu escrevi muitas coisas ao longo dos anos para mim mesma, mas confesso que gosto do frio na barriga de mostrar para as pessoas, mesmo que seja para críticas. E é isso, para uma pessoa sem fé (eu), é bom ter algo para acreditar (poesia).
A autora cita também uma passagem de Simone Weil: O real imaginário é fascinante e variado; o mal real é sombrio, monótono, estéril, entediante. Pensei muito na minha relação com os filmes de terror. Quando minha amiga se matou eu vi milhares de filmes do gênero, um atrás do outro. Eu preferia sentir medo e tomar sustos, do que ter que pensar na tristeza da morte dela. Em tempos de pandemia, de medo de morrer, de solidão, prefiro me assustar com monstros.
A personagem se isola com o cachorro que lhe foi dado. Ela diz que são duas solidões que se protegem, que ela não vai mais inventar mentiras para passar o ano novo sozinha. Eu sempre quis alugar um quarto de hotel e passar a virada de ano incomunicável. Agora tenho meus gatos e a companhia deles me basta. Não quero forçar um divertimento, não quero me obrigar a nada. Assim como ela.
Enfim, eu com certeza vou reler esse livro e vou perceber vários detalhes que deixei passar. Esse longo monólogo traz diversos temas que ficaram ecoando na minha cabeça. Quero falar deles na live, quero escrever mais sobre o livro. Não quero resenha, esse é um daqueles livros de identificação pela dor.
Oi, Michelle.
Tirando as leituras que fiz pro trabalho, só estou conseguindo ler porque entrei em leituras coletivas, o que me anima a ler para poder participar das conversas.
Você falando de O Amigo me deixou com vontade de ler, acho que vou aproveitar o desconto pra adquirir… Quem sabe consiga ler e participar da live com vocês.
Beijos,
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