#desafioleiamulheres Fevereiro

Eu acho que minha avó não queria ser mãe. Pelo que soube, ela engravidou na Lua de Mel, passou seus primeiros meses de casada grávida. Teve que aprender a lidar com a nova vida em meio a enjoos e desconfortos, e um marido nada agradável. Pelo que eu também soube, minha tia foi um acidente, oito anos depois da minha mãe.

Minha mãe só quis uma filha, esta que vos escreve, que por sua vez está com quase 33 anos e não terá filhos. Não vai se arrepender, não se sente incompleta e não se imagina cuidando de outra vida por diversos motivos. Um deles é a depressão. Não sei lidar comigo mesma em momentos de crise, como cuidarei de outro ser? O lado financeiro é outro ponto. Eu ganho pouco, estou sempre me virando, mal e mal dou conta de mim mesma. E por sua vez, o mundo está cada vez mais fodido e eu gosto de silêncio.

Esse é meu blog pessoal e aqui estou eu me justificando por não querer ter filhos. Ser mulher é isso, pedir sempre desculpas e se justificar o tempo todo.

Eu trabalho numa editora e ano passado lançamos um livro sobre feminismo e maternidade. Acompanhei a autora até uma roda de conversa com mães. Foi assustador. Algumas amavam a maternidade, sentiam a vida da forma mais plena possível. Outras se sentiam culpadas por terem voltado a trabalhar. Todas ricas. Como será a vida de uma mãe pobre, que não pode fazer escolhas?

Acompanho relatos de conhecidas em redes sociais, a não glamourização da maternidade, as noites sem dormir, o dinheiro gasto e a eterna preocupação, mas tudo isso rodeado por um amor imenso. Eu não encaro as consequências desse amor. “Quem vai cuidar de você quando você for velha?”. Já me perguntaram isso. Acho egoísmo colocar uma pessoa no mundo só para que ela cuide de mim. “Não ter filhos é egoísmo”. Pois eu acho o contrário.

Hoje acordei cedo e peguei o ônibus para visitar meus pais. Na quase uma hora do caminho eu devorei o livro Contra os Filhos da Lina Meruane, publicado pela Todavia com tradução da Paloma Vidal. Terminei a leitura há pouco menos de duas horas. Ele me acompanhou durante o dia todo e me fez pensar em todas essas questões acima.

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O nome pode chocar, afastar as mais radicais, mas a reflexão de Meruane é incrível. Ela fala de Virginia Woolf e de Sylvia Plath, de diversas escritoras que quiseram ou não ter filhos, e como a maternidade impactou suas obras. Ela também fala de aborto, da história das mulheres no mercado do trabalho, de como mulheres ainda ganham pouco, mesmo trabalhando mais.

Lina Meruane tira aquela romantização da maternidade com uma frieza calculada. Sinto que é preciso pisar em ovos para falar dessa questão, ela calça um coturno e pisa com a maior força possível. Ela me fez pensar muito no livro Ana de Amsterdam, da Ana Cássia Rebelo, na crueza para falar dos filhos. Karl Ove Knausgård fala num dos livros que olhar para seus filhos não lhe traz a mesma emoção de olhar para um quadro. Mas ele pode falar isso, afinal, ele é homem.

Mulheres que deixam seus filhos com os pais e vão seguir suas vidas ainda são as vadias sem coração. Pensei no filme Sonata de Outono. Da primeira vez que vi eu condenei aquela mãe que abandonou as filhas com o marido para seguir sua carreira como pianista. Por que condená-la sendo que diariamente homens fazem a mesma coisa, ou até mesmo pior?

O nome do livro choca, mas acho que a intenção da autora foi justamente chamar a atenção, fazer o convite para a leitura. Maternidade deve ser uma escolha. Não existe relógio biológico, existe a sociedade cobrando da mulher aquele que deve ser seu papel desde épocas medievais. Eu escolhi não ter filhos, e está tudo bem. Espero um dia não sentir mais a necessidade de me explicar.

 

5 thoughts on “#desafioleiamulheres Fevereiro

  1. Eu sempre fico divida entre querer e não querer ter filhos, e a maternidade, principalmente a desmistificação dela, sempre me interessa. Já quero ler esse livro !

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